Limitação da paleta olfativa, estabilidade e fixação da fórmula são alguns dos desafios no desenvolvimento de fragrâncias exclusivamente com matérias-primas vegetais.

O Brasil é o segundo maior mercado de fragrâncias do mundo, atrás apenas dos EUA. Mas, se fizermos um recorte na categoria, abordando apenas fragrâncias naturais, o cenário é bem diferente.

“A perfumaria natural ainda representa uma fatia muito pequena no Brasil, quando comparada ao tamanho do mercado tradicional. Enquanto em países europeus já existe uma cultura mais consolidada em torno do natural, aqui a presença ainda é bastante tímida, embora crescente. Estimo que não chegue a 1% do mercado nacional”, afirma Wagner Azambuja, proprietário e CEO da Quinarí, empresa familiar de óleos essenciais e produtos naturais.

“Em conversa com uma amiga que estudava perfumaria na França, ficou claro que a perfumaria natural estava em ascensão por lá. Percebi uma oportunidade concreta nesse mercado. Após meses de trabalho intenso, em parceria com a perfumista botânica Ane Walsh, lançamos em 2019 a coleção de perfumes naturais da Quinarí”, diz o executivo.

Ele conta que o maior desafio na produção de fragrâncias naturais é a limitação da paleta olfativa. “Enquanto a perfumaria tradicional conta com milhares de moléculas sintéticas, a perfumaria natural depende apenas de matérias-primas vegetais. Isso exige do perfumista uma criatividade muito maior para atingir resultados sofisticados e harmônicos. Outro desafio é a estabilidade da fragrância. Como os óleos essenciais são vivos, repletos de moléculas bioativas, podem apresentar variações de safra para safra. Além disso, há questões técnicas de fixação e durabilidade na pele, já que sem sintéticos é necessário recorrer a insumos vegetais naturalmente fixadores, como o óleo de copaíba.”

Primeira – e até agora única – fragrância natural orgânica certificada do Brasil

Se além de natural, a produção for orgânica, há ainda mais restrições. A Herbia Cosméticos Orgânicos, superou todas elas, lançando há dois anos a primeira – e até agora única – fragrância natural orgânica certificada do Brasil. “Já havíamos tentado por duas vezes desenvolver um perfume orgânico, mas os resultados não atingiram a performance desejada justamente pelas restrições de matérias-primas”, diz o diretor executivo Rafael Krause.

Foi em parceria com a Givaudan que a Herbia chegou à formula final de Trau Benjoim Natur. “O projeto foi conduzido pelo perfumista Leandro Petit, em colaboração com nossa diretora de criação, Danielle Barbizan. Desenvolvemos 14 diferentes amostras até conseguirmos dar vida a essa verdadeira obra-prima”, ele conta.

A fragrância foi a vencedora na categoria Sustentabilidade e Impacto Ambiental no 1º Award Clean Beauty, premiação criada em 2025 pelas feiras Bio Brazil Fair | Biofach América Latina e Naturaltech. “A Herbia é uma empresa pequena e familiar de cosméticos e aromaterapia. Nunca imaginamos que o Trau atingisse dezenas de milhares de vendas. Nosso objetivo era provar, para o mercado e para nós mesmos, que era possível desenvolver um perfume certificado orgânico de alta qualidade e performance no Brasil”, comenta Krause.

A dōTerra lançou recentemente sua primeira coleção de perfumes, desenvolvida com ingredientes 100% naturais, em parceria com as casas de fragrâncias Robertet e Firmenich. “Somos uma das principais empresas de óleos essenciais com alta pureza e qualidade, que são a base tanto da aromaterapia quanto da perfumaria natural. O perfume é uma forma de tornar o uso dos óleos mais acessível e cotidiano, ampliando a experiência do consumidor e oportunidades de fidelização de clientes”, afirma Daniela Mattos, gerente de educação de produto.

Segurança para pele e saúde e benefícios emocionais e funcionais

Ela lembra que as fragrâncias naturais trazem mais segurança para a pele e saúde, pois não contêm ftalatos, parabenos, almíscares sintéticos ou solventes agressivos. “Elas também são menos propensas a desencadear alergias e sensibilizações e, por serem produzidas com óleos essenciais, ainda oferecem diversos benefícios emocionais e funcionais.”

Para Mattos, a perfumaria natural tem um bom potencial de crescimento no Brasil nos próximos anos, especialmente pela conscientização, cada vez maior, do consumidor brasileiro a respeito de ingredientes, impactos à saúde e sustentabilidade.

Esse tipo de consciência tende a favorecer produtos naturais. “Em cinco anos, o perfume natural pode se tornar um segmento importante dentro da perfumaria premium. Talvez atingindo algo como 15 a 25% do mercado de perfumes de ‘nichos bem-definidos’ no país. Em 10 anos, se as barreiras forem bem geridas, esse percentual pode crescer ainda mais, talvez alcançar algo como 10 a 15% do mercado total de fragrâncias pessoais, dependendo de tendências macroeconômicas (poder de compra, política de importação, custos de matéria-prima) e de como marcas locais se desenvolverem”, finaliza a gerente.